Acabei de completar uma semana em meu novo trabalho. Depois que a minha rotina sofreu esta mudança, eu tenho tido pouco tempo livre e esta é uma situação muito pouco familiar. Sempre estive acostumado a ter muito tempo. Viver pouco e aos poucos.
Não acho que possa reclamar do meu ofício. Trabalho perto de casa, com algo que gosto. A atividade certamente não tem o prestígio e a ludicidade de tantas outras, mas é real, é tangível, é rentável, não acho que eu possa esperar muito mais.
Mas à noite... à noite, eu tenho que viver. Eu, que estava acostumado a espalhar meus afazeres em pontos esparsos do meu tempo, vejo-me obrigado a condicionar tudo o que tenho de mais importante a pensar(ou não pensar) e(ou) a fazer, em um curto período. É a vida comprimida. É a vida em comprimidos para dormir.
Essa ideia de reunir tudo num curto espaço, é meio
assustadora para mim. Quando me dou conta, é tarde, passei muito tempo
ponderando, ou simplesmente o deixei passar. É hora de dormir. É hora de
repousar, juntamente com todos os desejos antigos e contidos, com todas as
neuroses, com todas as insatisfações, com todas as falhas, ausências... com a
atenção quase que inteiramente voltada ao novo cargo, com o temor de que logo
ele se afaste. Eu e todas as minhas usuais companhias, vamos repousar , para no
dia seguinte, após 6 ou 7 horas de sono, acordarmos, preguiçosos e caminharmos
emparelhados, numa recém adquirida jornada.
Meus desgostos são altamente fiéis. Não me abandonam nem mesmo durante a labuta.
A solidão é a mesma, as decepções que eu continuo tentando
atenuar com indiferença, também. Eu já não tento falar e ninguém demonstra
interesse em fazê-lo. Talvez seja melhor desta forma. Solidão não se vive a
dois.
Entre as longas horas de obrigação, que se alastram pelos
meus dias, sem serem mais inúteis que as longas horas de ócio as quais eu me
reservava, vou me dando conta do real motivador desta inquietação que me impede
de aproveitar efetivamente as poucas horas livres que tenho.
A vida é veneno para mim. Para todos, se analisarmos bem a
situação. Há quem não concorde, mas, é o que penso. E não sinta pena, caro
leitor. Não sinta coisa alguma, eu me acostumei com a situação. Mesmo com este
corpo e com esta mente fodidos, eu gosto de estar vivo. Talvez eu seja uma
espécie de ermitão moderno, trancado no meu quarto, fugindo de meus
semelhantes... mas, eles são tão diferentes, tão superiores... que diabos eu
faria no meio deles?
Não é uma forma convencional de viver, mas é a minha
maneira. É a forma que encontrei para
não pirar. Para alguns, sobreviver, é a saída. Mais do que isso, é martírio, é
auto-flagelo.
Ciente do veneno que me é administrado em doses diárias,
contido em cada segundo experimentado, percebi ter duas opções: partir de pronto,
ou tomar doses cotidianas do meu algoz. Optei(obviamente) pela segunda. E cada
pensamento, cada gesto, cada decisão, é um pouco de veneno que eu ingiro.
Talvez por isso, eu estivesse acostumado a fazer tão pouco. Administrava-me doses minimas e espaçadas, o suficiente para um equilíbrio saudável entre o viver e a inevitável abrasão mental e cronológica.
Mas agora, no novo contexto, com tão pouca disponibilidade,
eu faço tudo em pouco tempo. Tudo ao mesmo tempo. Me injeto doses cavalares, em
todo período de folga.
Me dei conta do que me assusta. Do que me impede de como os
outros, gerenciar meu tempo de forma saudável. Me dei conta da razão de estar
ainda mais confuso.
É toda essa vida
concentrada, injetada na veia. É viver muito, em pouco tempo. É viver demais
esse desgaste, esse desgosto, essa peçonha.
Quem me dera viver menos.
A vida cotidiana te condiciona a solidão, e não somente ela, mas a competição impulsionada pelas mudanças produtivas... Eu fiz um texto falando sobre isso num trabalho acadêmico de filosofia... Muito bom o texto!
ResponderExcluirhttp://pensamentosaoinvento.blogspot.com/
Obrigado, Nani!
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